Agrotóxicos: é indo para trás que se avança?

Postagem publicada originalmente em 2018 no nosso antigo blog.

O Brasil, mais uma vez, caminha a passos largos em direção contrária a que caminha o mundo. Somos especialistas em ser o chamado “do contra”. E isso não é privilégio desse ou daquele setor, mas algo quase sistêmico. Para ficar só em alguns exemplos temos a política, economia, urbanização, investimento em combustíveis fósseis (quando o mundo está investindo em alternativas limpas), preservação ambiental e, tema deste texto, na política de utilização de pesticidas agrícolas. Os chamados agrotóxicos.

É de longa data a preocupação com os efeitos nocivos que essas substâncias têm na saúde humana. Desde a publicação do livro Primavera silenciosa, de Rachel Carson em 1962, o mundo vem tomando consciência dos riscos causados pelos pesticidas agrícolas. Para quem não leu o livro, esta obra é um dos grandes marcos da questão ambiental global. A autora escreve sobre suas observações e de outros autores sobre os efeitos (hoje bem conhecidos) sobre a biodiversidade em áreas que utilizam essas substâncias. Os pesticidas são utilizados visando-se a eliminação de determinada espécie animal prejudicial à lavoura. Seu efeito, porém, não é específico e acaba eliminando diversos outros animais. Inclusive, animais domésticos.
Não deve ser muito difícil para o leitor perceber que se os agrotóxicos têm efeitos nocivos a animais domésticos, terão também sobre a saúde humana. Os agrotóxicos podem ter diversos efeitos à saúde humana, como: abortos, malformação em crianças, infertilidade em homens e, até mesmo, câncer.
Isso gerou uma grande debate na sociedade sobre os potenciais, e reais, riscos que os pesticidas agrícolas podem causar. Somado a preocupação com a saúde humana, o aumento da consciência ambiental, fizeram com que fosse defendido a redução de defensivos agrícolas em várias partes do mundo. Nesse processo, várias substâncias foram proibidas e muitas outras criadas. Com isso, tornou-se cada vez mais comum a procura por produtos orgânicos, para quem pode pagar. Já para quem não pode, o consumo de agrotóxicos vem crescendo cada vez mais.
Bem, traçado um pouco do cenário sobre o assunto para o leitor, vamos agora ver como nosso país vem tratando a questão. O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. E à medida que a nossa produção agrícola aumenta, consequentemente, aumenta o consumo dessas substâncias.
É nesse cenário que o Congresso nacional discute uma lei de flexibilização para o uso de agrotóxicos em nosso país. A relatoria é do Deputado Federal Luiz Nishimori do PR e a proposta original é de 2002 feita pelo então senador, Blairo Maggi, do Progressistas, que hoje é o ministro da Agricultura. Esse projeto visava concentrar a autorização para venda de pesticidas no Ministério da Agricultura. Nem é preciso dizer o quanto prejudicial seria para a sociedade essa decisão, pois o ministério é um órgão político onde o ministro toma decisões, muitas vezes, de caráter político e não com bases técnicas. Isso retiraria a isenção do processo de autorização, que hoje passa pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
Além disso, o projeto de lei muda o nome de “agrotóxico” para “produto fitossanitário”. O que é um escárnio, uma vez que esta medida tem como objetivo enganar a população ao se utilizar um termo “desconhecido” e mais ameno, em vez de agrotóxico termo amplamente conhecido e com alto índice de rejeição pela sociedade.
Várias soluções vêm sendo buscadas para substituir os pesticidas agrícolas, com destaque para a Agroecologia. Infelizmente, a agroecologia vem enfrentando grande resistência por parte dos produtores agrícolas que, por enquanto, não têm interesse em buscar novas forma de produção de alimentos em detrimento da maneira tradicional. Um cenário triste que, por enquanto, dificilmente irá mudar. Se depender de alguns nomes de nossa política, estaremos cada vez mais expostos aos riscos de se ingerir substâncias tóxicas, destruindo nossa biodiversidade e contaminando nossos mananciais de águas.
Diego D. Dias, biólogo, mestre em ecologia de biomas tropicais e consultor ambiental na Vellozia Estratégia e Consultoria Ambiental.
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