
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) é uma instituição que monitora, por imagens de satélite, tanto o desmatamento quanto queimadas no Brasil. Segundo o instituto, o número de focos de queimadas nesse ano, no período de 01/Jan até 13/Set, já é o maior nos últimos 7 anos, o que causou grande repercussão na mídia nacional e internacional. Os biomas Pantanal e Amazônia foram os que tiveram o maior número de focos em 7 anos.
Apesar dos números altos, dados do Inpe mostram que já existiram na Amazônia anos onde houveram muito mais queimadas do que em 2019, como 2004 e 2005 que tiveram altíssimas taxas de desmatamento (2004 sendo a segunda maior taxa de desmatamento, calculada desde 1989) e os mais altos índices de queimadas (que são monitoradas desde 1998). É fato que nesta época era mais fácil desmatar e queimar na Amazônia, porém, com a criação, em 2004, do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), a eficiência do sistema DETER (sistema de alertas de alteração da cobertura florestal na Amazônia, feito pelo Inpe e utilizado como forma de fiscalização pelo Ministério do Meio Ambiente) e o aumento da fiscalização e combate ao crime organizado a partir de 2009 (na segunda fase do PPCDAm), diminuíram drasticamente as taxas de desmatamento na região.
Ao que tudo indica, em 2019 o desmatamento na Amazônia legal será maior que o do ano passado, além da retomada já confirmada dos altos níveis de queimadas, segundo o Inpe. É certo que o tempo mais seco no Brasil favorece as queimadas, principalmente em biomas como o Cerrado. Porém, segundo o pesquisador Alberto Setzer, do Programa Queimadas do Inpe, as queimadas que veem ocorrendo são todas de origem humana, já que, para se ter queimadas naturais precisa da existência de raios, o que não está acontecendo na região central do Brasil e sul da Amazônia, regiões que estão numa seca prolongada.
Um artigo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), demonstra que 10 municípios na Amazônia com as maiores porcentagens de desmatamento também são onde estão ocorrendo mais incêndios. Também é demostrado por meio de análises estatísticas a correlação positiva do aumento do desmatamento com o aumento de queimadas, ou seja, a Amazônia está queimando mais em 2019 devido ao aumento do desmatamento, o que não é justificado pela época seca do ano, que tem uma estiagem mais branda do que outros anos.
O governo brasileiro criticou a confiabilidade dos dados do Inpe e disse que irá contratar um novo sistema de monitoramento. O presidente Jair Bolsonaro chegou a dizer que os dados do Inpe eram mentirosos e que ONGs seriam as responsáveis pelas queimadas na Amazônia.
Declarações do Presidente Jair Bolsonaro, em sua fase de candidatura, como “o Brasil tem áreas protegidas em excesso que atrapalham o caminho do desenvolvimento”, “que iria combater a indústria da multa do Ibama e do ICMBio”, somadas ao aumento da ineficiência da fiscalização (devido aos menores investimentos nos órgãos fiscalizadores como Ibama e o ICMBio), impunidade aos infratores e a morosidade da Justiça, encorajam e ajudam no aumento do desmatamento e queimadas no Brasil neste ano, em especial na Amazônia.
A pressão internacional que nosso país vem sofrendo está aumentando. Algumas empresas que importam produtos brasileiros como o couro e produtos agrícolas, estão parando de comprar tais produtos. Além disso, acordos comerciais com a União Europeia (UE) estão em xeque, já que os agricultores de países europeus temem a concorrência desleal de produtos brasileiros produzidos sob regras ambientais menos rígidas que as europeias. Também, países como a Noruega e Alemanha anunciaram a suspensão de verbas doadas para o Fundo Amazônia, o que significa menos poder de fiscalização da Amazônia.
A Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), também conhecida como bancada ruralista, demostrou insatisfação com o desmatamento e as queimadas ilegais que acontecem desenfreadamente neste ano na Amazônia. Segundo eles, tais fatos estariam manchando a reputação do agronegócio brasileiro no exterior. Reputação essa que foi construída ao longo de muitos anos e que agrega grande valor aos produtos agrícolas brasileiros. Vários mercados somente são acessíveis ao agronegócio brasileiro devido ao cumprimento da legislação ambiental brasileira. O desrespeito à essas leis acarretaria na perda de grandes fatias do nosso PIB (Produto Interno Bruto).
Diante de vários riscos, como os já citados nesse texto sobre o acordo com a UE e o boicote de produtos brasileiros, políticos estão se movimentando. Já há projetos de lei que visam o diminuir o desmatamento, como a Lei do Desmatamento Ilegal Zero, que tem o intuito de punir mais severamente os infratores. Além dela, uma outra proposta de lei que cria a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA) com o objetivo de incentivar indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e produtores rurais a conservarem áreas de preservação e a recuperam áreas degradadas em suas propriedades.
A crise climática já é algo iminente, então, ao evitar as queimadas e o desmatamento, diminui-se a liberação de gases estufas que intensificam tal crise. Isso também vai de encontro ao Acordo de Paris, no qual o Brasil, apesar de ser signatário, não consegue e ainda está muito longe de cumprir um dos pontos do acordo, que é eliminar o desmatamento ilegal até 2030. Num mundo cada vez mais preocupado com as questões de preservação ambiental e a crise climática, o Brasil precisa mostrar que tem um agronegócio sustentável e que se importa com as questões climáticas, ou será colocado de lado pelos mercados internacionais, o que seria muito ruim para um país com uma economia já tão enfraquecida.
Danilo Vieira, biólogo, professor, mestre em Ecologia de Biomas Tropicais e consultor ambiental na Vellozia Estratégia e Consultoria Ambiental.